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quarta-feira 8 maio 2024
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Crise na mídia produz um mundo sem lei, imediatista e sem respeito a democracia

Crise na mídia  produz um mundo sem lei, imediatista e sem respeito a democracia

Após a Segunda Guerra Mundial, as democracias do mundo se uniram para criar uma estrutura institucional que sustentaria a paz e a estabilidade globais pelas próximas décadas. Para enfrentar a atual crise da mídia, é necessário um esforço semelhante, com governos, organizações da mídia e cidadãos trabalhando juntos para fortalecer um elemento essencial da democracia e do progresso humano.

Para restaurar o respeito à democracia é preciso repensar o poder e as relações com o Estado, a sociedade, a cidadania, os direitos humanos, a educação, a saúde do povo e, acima de tudo, o respeito à adversidade e à liberdade religiosa. Todas essas variáveis são de suma importância para ter um progresso midiático que leve as organizações profissionais de desenvolvimento de mídia adesempenhar um papel protagonista na identificação e construção da informação – por exemplo, ajudando as agências locais a fortalecer o gerenciamento da redação e garantir altos padrões jornalísticos. Felizmente, muitas organizações altamente competentes, operando nos níveis nacional e internacional, estão prontas para contribuir.

Enquanto a gente continuará pautando a informação como propriedade de alguns grupos de poder, a democracia será colocada em segundo plano, e os grupos de poder estarão perpetuando suas vontades, impondo julgamentos, escrevendo leis, manipulando a opinião pública sobre as necessidades distorcidas de informar para a desconstrução da identidade cultural, social e política do povo, convertendo-o em público.

Hoje, em quase todos os lugares do mundo, há uma crise na mídia que tem sido pensada de acordo com as estruturas de poder, muito embora uma estrutura de imprensa independente seja fundamental nas engrenagens da democracia. Para que ela funcione bem , os democráticos precisam fazer mais, criando espaços para o desenvolvimento social e político das comunidades, participando da construção do processo educacional dos jovens e abrindo caminhos para aqueles que se despontam como protagonistas. Nesse sentido, quase nada tem sido feito pelos países, principalmente pelos mais pobres, onde predomina o autoritarismo, a vontade como individuo dos governantes e de todos aqueles que fazem executar as leis. É um duro golpe para todos nós, quando esmorece a luta pela liberdade de pensamento e a capacidade investigativa da imprensa sobre aqueles que vilipendiam as leis, contrariando os princípios democráticos como garantidores da luta das pessoas, com níveis de favorecimento extremamente baixos.
Os meios de comunicação de todo o mundo estão travando uma luta grandiosa para adaptar seus modelos de negócios à era digital, com os jornais locais, em particular, entrando em colapso em massa por causa da perda de receita com publicidade. Sem publicações locais confiáveis, os leitores ficam cada vez mais suscetíveis as falsas narrativas sensacionalistas, com repórteres que não primam pela notícia e, sim, fazem valer o espetáculo, banalizando a verdade e a vida. Na medida que o jornalismo de alta qualidade é marginalizado, os líderes políticos de todo o mundo podem descartar a cobertura pouco lisonjeira como “
notícias falsas” e a falta de conjunto compartilhado de fatos acaba com a confiança na democracia e no Estado de direito.
Hoje, há perseguição aos trabalhadores que lidam com informação, principalmente os que lidam com jornalismo como missão de informar a sociedade.
Existem muitos reféns mantidos em diversos países, mas existem outros que estão sendo perseguidos, detidos ilegalmente e até mortos por fazerem seu trabalho. Seguindo um modelo aperfeiçoado de mídia, há em países como a Rússia, Hungria e Turquia um modelo de captura de midia, em que os líderes políticos e seus ricos amigos usam a mídia para promover seus projetos autoritários e interesses comerciais.
Por outro lado, em países da América Latina temos outro tipo de aparelhamento da mídia como promotora do caos, abrindo espaço para se desacreditar nas transformações sociais, mas válida pela justiça e pela ação de políticos- os fake news disparados por robôs contratados por empresários que não aceitam a evolução da sociedade por medo de perder seus espaços no processo de exploração através do neoliberalismo ou do domínio regional sobre os bens públicos.

Temos muitos planos em marcha, que destituem o lugar da informação, colocando o poder da desinformação como uma verdade, que só aparece sob um único ponto de vista, poder de destruição das massas, tornado –as um verdadeiro público passivo.
A confiança na mídia tem sido cada vez mais abalada pelos donos do poder que se impõem à revelia das decisões democráticas, fazendo florescer a corrupção sem nenhum freio. Sem uma mídia confiável, que responsabilize os governos e as empresas com verdade e idoneidade, deixando de lado os cortes ridículos que os editores fazem para garantir o proselitismo político que sustenta o poder e, com isso, poder sustentar os grandes grupos de mídia em um verdadeiro acordo de cavalheiros.
Tudo está mudando para pior e quem está perdendo são as instituições que a duras penas continuam a defender a liberdade e a democracia. Onde vamos parar? Ao que tudo indica, o futuro está mais para o lado escuro do passado do que para um lançador de luz sobre as mazelas do mundo moderno que se diz pós-modermo, mas tudo não passa de conjunto de operadores do caos, em uma ação desenfreada pelo domínio sobre o outro. Como exemplos sobre a consolidação de projeto de caos têm o uso geopolítico dos seguidores de Washington, que se perpetuam à revelia, com seus agentes infiltrados nos países pobres, garantido uma verdadeira guerra híbrida, que dilacera o tecido social desses países, impondo normas e comprando a mídia local para impor palavras de ordem ao povo que, com o comportamento de público, age como uma manada.
A resposta fraca a esta crise pelas democracias do mundo reflete mais uma falta de vontade política do que uma falta de soluções. De fato, apesar de seu escopo e complexidade, a crise na mídia está longe de ser intratável. E, por estar alimentando ameaças crescentes à democracia em todo o mundo, representa um grande desafio estratégico, que merece atenção e ação urgentes.
Os governos democratas devem reconhecer ataques à liberdade de imprensa e usar medidas como isolamento diplomático, negação de vistos e sanções diretas para pressionar os autores a cumprir suas obrigações sob o direito internacional de manter a liberdade de expressão.
Uma poderosa alavanca para lidar com isso é a política externa e de segurança. Os governos democratas devem reconhecer ataques à liberdade de imprensa e usar medidas como isolamento diplomático, negação de vistos e sanções diretas para pressionar os autores a cumprir suas obrigações sob o direito internacional de manter a liberdade de expressão.
O momento para essa ação já pode estar passando. Em julho passado, o Canadá e o Reino Unido lançaram uma iniciativa de liberdade de mídia, que exorta os países a assinar uma promessa de ação cooperativa quando a liberdade de mídia estiver em risco e defender a causa em todo o mundo. No mês seguinte, a França incluiu a questão na agenda da reunião do Grupo dos Sete, em Biarritz. Espera-se que isso revele progresso genuíno.
Uma segunda alavanca para resolver o problema é a assistência oficial ao desenvolvimento. Entre 2010 e 2015, apenas 0,3% dos US $ 150 bilhões que os países mais ricos do mundo gastaram na ODA foram para a liberdade de mídia. Essa participação pode aumentar significativamente – digamos, para 1%, como um grupo de organizações de apoio à mídia tem defendido – sem reduzir significativamente os gastos em outras áreas.
De fato, aumentar a APD para assistência à mídia pode ajudar a avançar outros objetivos de desenvolvimento. Uma indústria da mídia capturada por interesses adquiridos impede a reforma econômica, impede o comprometimento político e prejudica a coesão social – tudo essencial para o desenvolvimento inclusivo e sustentável. Para os países que lutam para construir ou manter um sistema democrático de governança, uma imprensa livre e fortalecida é indispensável.
O Sudão está agora enfrentando precisamente esses desafios, enquanto tenta construir uma democracia após a ditadura de Omar al-Bashir, há 30 anos. Durante essas transições políticas, as organizações de mídia recém-libertadas geralmente se alinham a um partido ou facção em particular, reforçando fissuras profundas e paralisantes. Num país em que a discriminação étnica, cultural e religiosa alimentou brutais guerras civis, os riscos não devem ser subestimados.
Até agora, a comunidade internacional fez muito pouco para ajudar no desenvolvimento da mídia e nos esforços de reforma do Sudão. Como argumentou o primeiro-ministro sudanês Abdalla Hamdok na Assembleia Geral das Nações Unidas em setembro, os doadores deveriam “revisar suas prioridades” e apoiar as reformas da mídia em países como o dele. Esses esforços – juntamente com a construção de um judiciário independente, revertendo o declínio da economia e enfrentando os crimes do regime de Bashir – são essenciais para uma transição bem-sucedida, disse ele.
Por outro lado, é preciso estabelecer novas prioridades aos países doadores em todos os lugares, buscando ajudar a lidar com as fraquezas econômicas, políticas e institucional dos governos. Essa situação aos poucos vai se agravando a tal ponto que os grupos dominantes se proliferam no poder, deixando a mídia cada vez mais vulnerável. É preciso criar mecanismos que ressignifiquem o poder do estado de direito, dando amplitude às leis para a construção de uma sociedade com instituições sólidas e confiáveis, que possam garantir apoio político capaz de reformar a mídia, através de uma governança democrática. Isso significa ajudar os governos a reformar ou fortalecer as leis da mídia, criando instituições confiáveis. Instituições de desenvolvimento como o Banco Mundial e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento podem ajudar aqui.