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quinta-feira 16 maio 2024
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Leitura de Taubaté – Bolsonaro e o caso com o quilombola recuperado

O nome dele era José Leiteiro. Os habitantes da cidade de Apalermada o conheciam há tempos, com registro ou sem registro. O Zé, como todos os chamavam, tinha um sonho na vida, não era um devaneio sofisticado ou cinematográfico, era uma utopia acessível; ele queria ver o Brasil dirigido por um presidente que desse espetáculos políticos ao próprio país e ao mundo.

O Zé adorou o espetáculo da facada dada em Bolsonaro durante um comício. O rosto expressando dor, o olhar dizendo “venci”, o meio sorriso afirmando “escapei dos debates”, a cena do leito hospitalar simulando um tiro com o dedo, uma atuação superior ao Rambo 24. O Bispo, personagem que desferiu a facada desapareceu, ninguém, até agora, apresentou um quadro médico convincente sobre esse personagem.

O Zé leiteiro, no entanto, vive euforicamente feliz, desde o dia que o seu herói, na época, deputado federal, defendeu o uso do auxílio moradia, uma insignificante quantia de 6 mil cento e sessenta e sete por mês, mesmo os possuidores de propriedades em Brasília. O seu ídolo intocável respondeu ao repórter ao ser questionado: “como eu estava solteiro naquela época, esse dinheiro de auxílio moradia eu usava para comer gente”.

O professor Leandro, homem culto da cidade, chamou o Zé leiteiro de lado, procurando aconselha-lo: “meu amigo, a palavra gente é indeterminada, pode se referir a pessoas, portanto homem ou mulher, povo, multidão, população. Ele com o rosto também indefinido que tem, pode comê-lo, pode comer a sua mulher, a cidade, o país. Não comemore tudo o que ele fala, você pode se dar mal politicamente, sexualmente, ladronamente”.

Passado um tempo, não sabemos quanto, Zé Leiteiro, no Bar do Tapioca, ria muito, um riso violador da própria comédia, ele comentava que o seu candidato a presidente espetáculo dissera no clube hebraica que fora num quilombola em Eldorado Paulista. Ele era deputado, estava em campanha, nesse espaço, segundo ele, vira um afrodescendente que pesava mais de sete arrobas.

Eles não fazem nada, segundo o deputado; acho que nem para procriadores servem mais.

O Chico Sabão encostou a boca na orelha do Zé Leiteiro e disse-lhe: “a mãe Joana, curandeira famosa tem uma mistura de quiabo, jiló, asa do rabo de coruja que é tiro e queda. Fale para o seu candidato a presidente espetáculo, que, se esse quilombola de 15 arrobas, beber um litro da fórmula da Tia Joana, o quilombola vai voltar a reproduzir e ele, político dos espertos, ficará feliz, contente, risonho e, talvez, gravido”.

Zé Leiteiro foi defensor e também apaixonado pelo Bolsonaro até o dia de 15/11/2001. A desilusão foi motivada por um fato sem relevância. Em Dubai, a maior cidade dos Emirados Árabes, os participantes da conferência realizada naquele país ouviram da boca do presidente brasileiro que a Amazônia não pega fogo. O problema em questão não está na Amazônia incendiada ou levemente tostada, mas no verbo “pegar”, empregado pelo político. Além de 3 árabes desmaiarem; 8 ajoelharam no carpete de pérola, pedindo perdão a Alá, por terem ouvido tamanha besteira, cento e dois fizeram xixi no solo sagrado. O problema mais sério, mais grave, é que a Amazônia deslocou-se mais de cem quilômetros, correndo na companhia de bruxas, fadas, capitão gancho, jacaré, gnomos, tentando pegar um pouco de fogo. A floresta ofendeu-se ao sentir-se incapaz de segurar um pouco de fogo, um isqueiro qualquer.

A floresta é perfeita, tem braços, dedos, cotovelos; ela consegue pegar as suas lendas, as águas, os pássaros, os animais desconhecidos, a música dos índios e, na festa do Boto, pegou uma tocha artesanal e a carregou no desfile dos pintados, dos dourados, e de um peixe falso como colonizador, chamado Besta-Lira, borboletas vermelhas e barbudas. A única coisa que a floresta não consegue e não conseguiu pegar, é uma espécie vivente chamado Militar que a devastou, desfigurou, criando uma estrada ridícula chamada transamazônica. No dizer da floresta, ela queria pegar um pouquinho só, questão de segundos, o Médice, Bolsonaro, Pazzuelo, e os médicos paralelos.

A floresta pega a chuva, pega o vento, pega flores, pega amor e vida. O problema, e nisso o presidente entra em seu estado psicopático é que os posseiros, garimpeiros, fazendeiros, ministros, funcionários de cargos elevados, incendeiam a floresta. Eles matam a floresta, devastam-na usando o fósforo bolso-nero, uma mistura de química, loucura, mentira. O verbo pegar representa o analfabetismo do nosso presidente.

Prof. Carlos Roberto Rodrigues – professor de Literatura